Do ponto de vista cósmico-cronológico, ou seja, considerando-se a evolução da Terra em torno de seu eixo e ao redor do Sol, vivemos todos num tempo único. Qualquer que seja o calendário adotado e até mesmo se nenhum o for, estamos todos sobre a mesma superfície que se move com regularidade, girando juntos. Do ponto de vista geográfico-cronológico (considerando-se o lugar específico em que nos encontramos no globo terrestre), já começamos a viver tempos distintos: enquanto para alguns é dia, para outros é noite; conforme o “gomo” da laranja do lugar onde estamos, o fuso-horário será diferente, conforme se evolua de dia para noite (conforme a Terra gire de Oeste para Leste).
Quando adotada uma concepção de tempo microscópica, a partir dos nossos corpos biológicos, a apropriação do tempo, pelo consciente em interação com o inconsciente, adquire singularidade extrema: ninguém vive no mesmo tempo, o tempo de um não é o tempo de outro ou de outros. Dois indivíduos conversando, sentados no banco de uma praça (Será isso ainda possível?), podem ser um sentindo o tempo escoar rapidamente (desejando que pare, para melhor aproveitar o momento) e outro com a sensação de que o tempo de arrasta lentamente (querendo se livrar logo do incômodo do encontro que transcorre). Seus tempos psicológicos, neste caso, não serão os mesmos. Da mesma maneira ocorrerá este tipo de desencontro quando um brasileiro falar ao telefone com um japonês (cada um estando em seu país) às 12 horas do Brasil (24 horas no Japão): um estará sob interrupção do sono e outro, do almoço.
Dizia John Milton (1608-1674) que “A mente é o seu próprio lugar”. Por extensão, pode-se dizer também que ela se baseia em seu próprio cronômetro. Assim, estarmos no tempo juntos é uma questão de ajuste mental e psicológico. Sob desajuste, dois corpos abraçados e se beijando estarão, de fato, separados no tempo, embora colados, no espaço. No momento do beijo, um poderá estar vivendo um presente que desejou no passado imediatamente recente, enquanto o outro não cessa, naquele mesmo instante, de querer que o presente se torne logo futuro, livrando-o de um desconforto difícil de confessar.
Estar ou viver juntos requer, portanto, um deliberado esforço de sintonização (colocar os ponteiros mentais ou psicológicos de acordo, entre si), mais do que para estar no mesmo espaço. Tarefa de difícil execução num tempo em que inclusive o espaço físico-geográfico que as pessoas ocupam em comum não é vivido igualmente por elas: dois sentados à mesma mesa, frente a frente, podem ser um ali, de fato, e outro num espaço-tempo virtual distante, usando um telefone móvel para se conectar a uma rede social.
Existem, pois, sólidas razões para que uma pessoa possa dizer, no meio da multidão ou junto de seus amigos e familiares: “Estou só, assim como que estão comigo. Furar esse bloqueio é uma arte das mais exigentes. Sim, tinha razão Vinícius de Moraes (1913-1980): “A vida é a arte do encontro, embora haja tantos desencontros pela vida.”
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