Esperar, aguardar, expectar toma parte expressiva da nossa vida, consome significativa parcela do tempo vivido. A vida, aliás, começa com uma espera: a gestação, a mãe “esperando filho” – espera inconsciente para o feto (envolto na placenta, ele não está propriamente “esperando” para vir ao mundo), mas plenamente sentida pela gestante (temerosa ou corajosa, feliz ou infeliz pelo que acontecerá).
Quando ainda não havia tecnologia para se conhecer o sexo do bebê antes do nascimento, o desvendamento deste “mistério” impunha uma espera adicional, da parte não só da mãe. Nos tempos da realeza (quando um varão era esperado para sucessor) essa espera ganhava contornos dramáticos e afetava o balanço do poder.
Também o fim da vida tem a ver com a espera, e muito: todos “esperamos” um dia morrer, os demais esperam que um dia venhamos a falecer (e lhes damos o troco). Não é descabido dizer, portanto, que a vida toda é uma espera, esta espera fatal pela morte. Embora sempre com a absurda, mas muito palpável esperança de que a Morte nos esqueça, atarefada no atendimento dos demais. Não nos dando por satisfeitos, quando admitimos a morte, inventamos uma saída: outra vida depois desta...
Esperar é nossa sina! Ter esperança é o melhor modo de lidar com isso: o desespero, mais do que o crime, definitivamente não compensa. Ainda que esperemos que um dia aconteça, “A esperança é a última que morre”.
Espera tem duas irmãs, uma bem feia e grosseira, outra bonita e polida: Agonia e Paciência. De fato, Espera raramente nos acompanha sozinha nas coisas da vida. Qual das suas irmãs estará conosco em cada situação dependerá, em boa parte de nós mesmos. Será Paciência se conseguirmos nos dar bem com ela; quando não é assim que se dá, Agonia toma seu lugar, mesmo sem ser convidada – e traz junto sua parceira ocasional, Desesperança, prima do famigerado Desespero.
A espera é uma espécie de ponte, às vezes pinguela, entre o agora e o depois (não importa quão longe o depois esteja). É serva do tempo, pois, já que permite que ele corra “por um tempo”, sem obrigar-se a entregas. Assim, esperar é ser benevolente com o tempo, permitir que ele exercite seu correr sem fatigar-se com compromissos. Há que se manter com o tempo este pacto de não agressão, de compreensão, pois do contrário ele se rebela e, então, salve-se quem puder!
Saber esperar (atitude fundamental, desnecessário dizer) não é esperar sempre e indefinidamente. Se o que se espera é ruim – como, por exemplo, um regime político de exceção – exige agir, interferir, influenciar para que a situação não chegue ao indesejável, ao inconveniente, ao desastroso, ao desumano: “Quem sabe faz a hora, não espera acontecer” (Geraldo Vandré, 1935-).
Sob um regime autoritário, Esperança é encarcerada, Agonia corre solta, Desespero é senhor. A vida, sem liberdade e tantas vezes massacrada, torturada, eliminada, perde encanto e valor. Só a resistência e a luta são capazes de resgatá-la. Resistência e Luta: casal de quem renasce a Esperança. A gestação, como não poderia deixar de ser, é uma espera. Saber fazer a hora não é antecipar o parto (prematura, Esperança corre risco de morte). Mas não é, por outro lado, deixar a criança no ventre quando está dando chutes na barriga da mãe.
Resistir e lutar, quando necessário, só se faz bem feito não esquecendo nunca que esperar tem a ver com aguardar (expectar), desejar (almejar, anelar, aspirar), supor (conjecturar, imaginar, presumir, supor, prever) e confiar (acreditar, crer, confiar, esperançar-se).
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