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  • Foto do escritorValdemir Pires

18. Homem e tempo (Tempo - Livro I)

Atualizado: 14 de mai. de 2021


Arte: Interpretação de Sobre o tempo (de Thedy Corrêa), por Eder Brito, da Banda Dinossaurus.


O tempo não é algo no mundo ou nas nossas vidas, como qualquer outra coisa ou evento, que em um momento é ou está e, em outro, não mais é ou está. Ele vai além disso, pois fundamenta a existência do homem, assim como de todas as coisas, sob a perspectiva da mente humana.

O tempo não é nem está; ele existe sem precisar ser ou estar. Ele está em nós e nós nele, mas quando deixarmos de ser, ele continuará, ainda que talvez “sofra” a falta de nossa presença “inventora” do tempo identificado e medido, percebido como parte de tudo que foi, é ou pode vir a ser.

Sem nossa presença no mundo, o tempo se apresentaria como um continuum eterno, sem começo nem fim, ou, em outras palavras, sem passado, presente e futuro, já que essas “fatias”, como segmentos de tempo em relação a algo ou alguém, não seriam concebidas, repousando no nada da ausência do homem no mundo. O tempo então, aí “estaria”, mas seria outra coisa, que não a que conhecemos e vivenciamos.

Homem e tempo, tal como os concebemos, são, portanto, indissociáveis: sem tempo não há homem; sem homem, não há o tempo concebido pela mente humana. Do tempo, assim entendido, derivam percepções essenciais da vida.

A vida dos seres, assim como a existência de todas as coisas – grãos de areia, edifícios, estações do ano, galáxias, (ideias também?) – têm começo e fim, surgem e desaparecem. Começo é um ponto, na reta infinita do tempo, em que algo inicia sua manifestação; o fim é o ponto no qual ela termina. Início e fim são inimagináveis sem que antes o tempo seja definido como este passar, esse transcorrer que preenche o intervalo entre começo e fim.

Como imaginar a vida, as coisas, os fenômenos, o mundo, nós mesmos e os outros, sem que tudo e todos estejam relacionados a um começo e a um fim? Como organizar as nossas vidas sem as noções de passado, presente e futuro, sem poder nos referir a um quando para tudo? Isso só seria possível sem o pensar que nos caracteriza e constitui, ou se este pensar, por algum motivo, deixasse de operar conforme nos habituamos.

Mas quando começou a vida, a Terra, o Universo? A teoria, até aqui, indica que a Terra tem algo em torno de 4,5 bilhões de anos, a vida nela tendo se iniciado bem depois; as células eucariontes (capazes de formar animais e vegetais) devem ter surgido por volta de 1,7 bilhões de anos atrás e os humanóides, constituídos de células que têm um núcleo organizado, vieram depois, resultando no tardio homo sapiens. E o Universo? Bem, antes de definir quando ele começou, a teoria precisa dizer o que ele é (um conjunto infinito? – de galáxias?) e de que modo se formou (a partir do big-bang?)

Enquanto vamos vivendo, como indivíduos e como espécie, seguimos nos fazendo perguntas sobre esses começos, e colhendo respostas ainda incompletas ou insatisfatórias, parte de nós se consolando com concepções, não raro conflitantes entre si, de um começo mágico, fruto da criação por um ser superior. Por esta mesma via, consolam-se os que têm fé na ideia de um fim que é recomeço (vida eterna, fora do tempo).

As nossas dúvidas sobre os grandes começos (do universo, da terra, da vida) e os nossos modos de lidar com elas não inviabilizam nossa existência baseada na certeza dos começos e fins menores: da vida, do ano, das estações, dos nossos afetos, das nossas provisões. Isso porque é neles, nos começos e fins menos inquietantes, que nos concentramos, premidos pelas necessidades e embalados por alguns desejos. Assim, o tempo “nos escapa”, enquanto nos prende. E quando acabamos, não é fácil dizer se dele escapamos ou se ele nos condenou ao fim.

Antes do fim, sofremos e gozamos o que foi (passado), o que é/está sendo (presente) e o que pode vir a ser (futuro); somos revolvidos pelo durante, na companhia de outros, temendo ou desejando alguns sempre e alguns nunca/jamais; temos certeza do antes, somente quando ele se torna depois; em nada nos acompanha a ideia de que um segundo não “dura um segundo” (isso não é resposta!), mas 9.192.631,770 pulsações de um átomo de césio (para o físico) ou, para o astrônomo, o correspondente à unidade dividida por 31.556.925,97474 (tempo que a Terra leva para se deslocar 360 graus).

Somos sopros (almejando ventos), fagulhas (almejando labaredas), com a gravidade de ter consciência (incompleta, imperfeita, nem sempre acionada) da nossa própria contradição em meio ao tudo e ao nada, ao efêmero e ao eterno, ao ínfimo e ao infinito. Cheios de medos, mas também de ousadias. Somos apesar do tempo, no tempo, com o tempo.


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