top of page
  • Foto do escritorValdemir Pires

20. Tempo e poder (Tempo - Livro I)

Atualizado: 14 de mai. de 2021


Arte: Música autoral No dias de hoje, de e por Cléder-X.


O poder é inerente ao homem. O poder é tão eterno quanto eterna possa ser a humanidade. Onde quer que existam duas ou mais vontades, elas jamais coincidirão em tudo que afeta a cada uma, daí emergindo a necessidade de uma prevalecer e a outra se anular ou ser anulada (mesmo que parcialmente). Força e fraqueza são elementos da natureza humana, a política a arte de seu manejo, sempre ao sabor da gangorra do poder.

Gangorra do poder porque este, de fato, vai e vem, muda de mãos inexoravelmente, ao longo do tempo. Ninguém se eterniza no poder. O poder é como o tempo: fica, enquanto as pessoas passam. A Política, desde que elevada à condição de ciência, pelas mãos de Nicolau Maquiavel (1469-1427), consiste exatamente num instrumento racional e sistemático de conservação e divisão do poder, antes compreendido e explicado por outras lógicas, entre as quais a consanguinidade e a escolha divina.

No alentado volume “Ascensão e queda das grandes potências” (1989), Paul Kennedy (1945-) faz uma análise panorâmica muito bem documentada[1] da dança do poder na geopolítica global, com foco nas transformações econômicas e nos conflitos militares de 1500 até final do século XX (avançando tendências em direção ao século atual). Após comentar o caso da China dos Ming, toma como objeto os casos da Espanha, da Holanda, da França, do Império Britânico e dos Estados Unidos, em tese a próxima “vítima”). Fica claro que não existiu (e provavelmente não existirá) força econômica, política e militar global perene. De um modo ou outro, por razões e acontecimentos concretos que variam, as potências ascendem e declinam, a gangorra sendo movida por conflitos que surgem contra seus interesses, por incompetência ou inabilidade das lideranças ou por causa do amadurecimento de condições engendradas pelas próprias contradições dos arranjos de poder.

Mesmo que não se aceite a tese geral de Kennedy para a verificada alternância histórica do poder global entre os impérios (o alto custo de manutenção da supremacia militar corroendo a base econômica), sua obra é uma formidável sistematização dos dados e informações que documentam aquela alternância, reforçando a certeza de sua inexorabilidade, antes conhecida, evidentemente, tendo abalado impérios de outras eras, o romano, por exemplo.

Assim como é inexorável com o ser humano, por conta do devir que consigo traz, levando o indivíduo à ruína (de suas conquistas) e à derrocada final (de seu corpo mortal), o tempo solapa o “corpo social” dos impérios; estes também nascem, crescem, perdem vigor e desaparecem. Não fogem a esta regra os governos nacionais, imperialistas ou não. Todo governo é passageiro, por maior que seja a prorrogação que consiga obter, por meio da conquista da simpatia dos governados ou por meio da supressão da possibilidade destes de a ele se oporem. Que se sucedam os governos é natural e previsto, estabelecido e organizado, nas democracias, nisso residindo seu maior valor (liberdade). Ao contrário do que acontece nas experiências ditatoriais.

Daí nasce a questão: quanto tempo pode durar um governo que se impõe por meios não democráticos (ditadura, manipulações, falsificação democrática etc.)? Cada caso é um caso, mas todo usurpador do poder legítimo (necessariamente originado da escolha e da aceitação dos governantes) e seus asseclas e apoiadores devem saber que seus dias são contados, e que a propensão é que o número deles se reduza na proporção da capacidade de indignação e revolta daqueles a quem oprimem. Indignação e revolta coletivas, portanto, aceleradoras do relógio do tempo contra as maldades e ruindades dos poderosos que se esquecem que nenhum andor ou charola se sustenta no ar por si mesmo.

E quanto à indignação e à revolta coletivas, é possível acelerá-las? Ou elas têm seu próprio tempo, ritmo e ponteiro?

[1] Das 675 páginas do livro, 161 (quase um quarto) são notas documentando o que vai sendo afirmado ao longo da obra.





11 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo
Post: Blog2_Post
bottom of page